segunda-feira, 25 de agosto de 2014

EDUARDO GONZALEZ ADVOGADO


Criança requerida por avós franceses permanece no Brasil
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A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os avós maternos, brasileiros, devem ficar com a tutela de um menor nascido na França, cujos pais morreram em acidente. Os ministros entenderam que deve prevalecer o melhor interesse da criança, que já mantém vínculo socioafetivo com a família brasileira há quase três anos e está obtendo um tratamento bem-sucedido no país.

Na decisão, não houve preferência ou juízo de valor quanto aos avós do menino. “A decisão não é em virtude de a avó paterna não reunir condições para ter o neto em sua companhia”, disse o relator, ministro Marco Buzzi. “Mas porque as graves circunstâncias ditadas pelos acontecimentos da vida já submeteram esta criança a agruras bastantes para que agora uma nova se imponha”, afirmou.

A disputa nos tribunais começou após o acidente, ocorrido em 13 de março de 2011. Houve uma colisão entre uma van e um caminhão que deixou sete mortos na estrada Teresópolis-Nova Friburgo. Entre as vítimas na van estavam os pais do menino, um fotógrafo francês e uma professora brasileira.

O menino sofreu traumatismo craniano, passou três meses em coma e foi submetido a seis cirurgias. Com sequelas cognitivas, ele tenta recuperar a fala e a capacidade motora em tratamento neurológico, fisioterápico e fonoaudiológico.

Atualmente, mora com os avós maternos no Brasil. Os avós paternos, franceses, ingressaram na Justiça para ficar com a guarda. O ministro destacou, entretanto, que não é o momento de o menino ir para a França. Se o acidente tivesse ocorrido naquele país e o tratamento fosse iniciado lá, acrescentou, certamente a decisão penderia para o lado da família francesa – a qual, de todo modo, deverá ter amplo acesso ao menor, conforme definir o juízo tutelar.

Guarda compartilhada

A decisão de primeira instância foi pela tutela compartilhada, e o menor ficou sob os cuidados da avó materna. Os avós paternos recorreram da decisão. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) determinou a guarda exclusiva aos avós franceses. Em janeiro, uma medida cautelar garantiu a permanência do menino no Brasil até o julgamento do recurso especial pelo STJ, que ocorreu terça-feira (19).

Os ministros da Quarta Turma levaram em conta as informações de que o garoto está adaptado aos familiares do Brasil e o tratamento de saúde vem tendo êxito. “Não se pode ignorar o conteúdo do parecer psicossocial e dos laudos médicos elaborados por diversos e conceituados profissionais que assistem a criança desde o acidente, os quais recomendam, sem exceção, sua manutenção no Brasil”, disse o relator. “Há risco de ruptura da recuperação não apenas física, mas também emocional, uma vez que os relacionamentos já estão estruturados”, acrescentou.

A defesa dos avós paternos alegou que a guarda da criança com os avós brasileiros violaria a Convenção de Haia, pois os pais tinham domicílio em território francês. A Quarta Turma, no entanto, considerou que o caso não se confunde com o de sequestro.

“A hipótese dos autos é distinta, pois o menor encontrava-se no Brasil, sob a guarda de seus pais, até o dia do acidente em que ficou órfão, não tendo sido removido de forma ilícita de seu país de origem”, disse o relator.

Trata-se, segundo Buzzi, de questão que envolve a tutela de interesses disputados entre particulares – sem demandar a intervenção da União na causa, conforme expressamente admitido pela Autoridade Central da Administração Federal, órgão do Ministério da Justiça.

Justiça francesa

Outro processo tramita na Justiça francesa e estaria em favor dos avós paternos. Mas como a decisão não transitou em julgado, não pode ser executada ou homologada pela Justiça brasileira.

O relator do recurso no STJ ponderou que, com o advento da convenção internacional sobre os direitos da criança, que adotou a doutrina da proteção integral, foi modificada profundamente a orientação acerca dos fatores que devem ser considerados nas decisões referentes à infância e à juventude, prevalecendo desde então o princípio do melhor interesse da criança.

O relator ressaltou que a própria criança, no futuro, poderá iniciar a discussão quanto à sua ida para a França em caráter provisório ou definitivo, como resultado de seu melhor interesse. Ele apontou que, segundo o artigo 28, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente, se a criança contar com menos de 12 anos, sua opinião será levada em consideração; se for maior de 12, sua anuência será condicionante.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

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